É quando eu leio um livro como esse que eu entendo o sentido de um livro se tornar um clássico. A insustentável leveza do ser ainda não é um livro clássico como a Ilíada, mas devemos levar em consideração o tempo, Kundera é contemporâneo, está ai vivo, acredito que na França.
Mesmo sendo atual, este é um livro mundialmente famoso, e não famoso como Harry Potter (sem jamais tirar o crédito dessa série que permeou minha adolescência, eu tinha 11 anos quando li o primeiro livro!), o seu conteúdo não é o mesmo que os dos best sellers atuais, há toda uma reflexão sobre a vida, a narrativa só se dá através da busca dos personagens pelo sentido da vida. É o tipo de livro que você lê, se envolve, chora, e ainda termina um pouco mais consciente de si mesmo, ou menos ignorante quanto a complexidade da vida.
Eu o li em poucos dias, eu amei, eu relerei algum dia, e eu recomendo a qualquer um.
Como os demais livros que eu li esse ano de Milan Kundera, A insustentável leveza do ser está recheada de sensualidade, ou talvez fique melhor, de sexo. Thomas é um médico de meia idade que tem um filho com a esposa do primeiro casamento, mas após o divórcio corta relações com ambos, e até mesmo com seus pais, no entanto ele não é sozinho, leva uma vida animada pelos seus vários encontros com as suas diversas amantes, Para ele é na hora do sexo que ele pode vislumbrar o 0.01% de individualidade que existe em cada mulher, e é essa porcentagem que ele procura em suas relações. Para ele não é traição ter suas amantes, pois o sexo nada tem com o amor.
Porém, essa explicação não é suficiente para acalmar os ciúmes de Tereza. Uma mulher que desde criança olha no espelho e procura ver sua alma através de seu corpo. Quando conhece Thomas ela decide que é hora de mudar sua vida e vai atrás dele. Sem muitos contornos eles logo se amam, e é um amor imenso, um não imagina viver sem o outro, apesar de seus defeitos (vamos concordar que os defeitos são deles na maior parte). Por isso, casam-se, nunca têm filhos, no lugar Thomas dá a Tereza um cachorro Karenin, e assim eles vivem em meios aos ciúmes e às amantes, em especial Sabina que também tem sua história contada, mesmo depois que sua relação com Thomas chega ao fim, depois que ela tem um caso com Franz, depois que ela parte para América.
Além da profundidade criada a partir dos questionamentos dos personagens, a história tem um contexto tenso: a invasão russa na República Tcheca. Thomas um médico importante, por causa de um artigo de jornal é forçado a exilar-se na Suíça, e quando volta perde seu emprego. Tereza que tornara-se fotografa tem seu apogeu profissional nos poucos dias de euforia que se seguiram a invasão. Sabina como os outros dois também se exila, mas jamais volta para casa.
Não acho que seja possível resumir mais. Claro que é possível falar mais sobre o livro, mas ai seriam minhas reflexões, aquilo que eu entendi, aquilo que absorvi na minha leitura. E por mais que isso possa ser interessante não é a minha intenção.
Vale ressaltar apenas que esse livro traz o mesmo questionamento que O leitor, como conviver com a consciência de seus atos? Édipo ao descobrir que matara seu pai e depois casara-se com sua mãe, fura seus próprios olhos e exila-se no deserto, mesmo tendo feito tudo de forma inocente. Como podem viver tranquilamente aqueles que cometeram atos que sabiam ser condenáveis? Mas qual a porcentagem dos invasores/nazistas que sabiam o que estavam fazendo? Qual a porcentagem que apenas estava cumprindo ordens e seguindo um ideal que provou-se atroz? Qual a melhor forma de sobreviver nesses tempos? Resistir pela honra? Retratar-se pela vida?
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